domingo, 21 de dezembro de 2014

Perdi



Chegou a hora da sinceridade. Vou abrir o meu coração. Senta que lá vem história.

Eu sempre quis fazer intercâmbio. Só que esse sonho tinha dois probleminhas: grana e permissão dos pais. No início, eu achava que o problema era a minha mãe, tinha medo da família me deixar morrer de fome, de um ataque terrorista, de eu ser estuprada, usar drogas, ou morrer. Sei lá. Depois, eu consegui convencê-la e o problema foi o meu pai e uma coisinha chamada ENEM. Para ele, nada é mais importante que isso. Bom, isso seria besteira se não fosse a questão dinheiro. E isso eu não tinha. Por isso, depois de pesquisar muito e tentar convencê-los incansavelmente, eu desisti.

Porém, em fevereiro desse ano eu fui a uma agência da CI com o meu primo e lá o vendedor conversou comigo sobre isso. Tudo o que ele falava, eu já sabia. Mas foi diferente. Apesar de ter pesquisado muito, eu nunca tinha ido ali. Me senti como da vez que eu fui na STB fazer a minha carteirinha de estudante e um garoto estava fazendo sua entrevista para um intercâmbio. E eu só pensava: "um dia eu vou estar no lugar dele". Daquela vez, eu não fiz nada além de sonhar. Dessa vez, eu coloquei a mão na massa.

Cheguei em casa, peguei uma lata de leite condensado, nescau, manteiga, granulado e muita expectativa e fiz bolinhas negras de sonhos para vender na escola. Brigadeiros. Hmm. Vendi. Todo mundo adorou. Eu me animei.

Me juntei com uma prima, comecei a trabalhar duro. Pegamos um isoporzinho e fomos bater perna na praia da Paju atrás de uns trocados no Carnaval. Sanduíche natural, cachorro quente, flau e suco. Tentamos. Venci a timidez e saí gritando para ver se alguém queria alguma coisa. Consegui uns trocados mas não dava para ganhar muito.

Foquei na escola. Vendi brigadeiro, suco, sanduíche e tudo mais. Os professores me ajudavam porque sabiam que aquele era o meu sonho. Certa vez, quando eu derrubei um depósito cheio de cajuzinhos no chão, um professor pagou toda mercadoria perdida para eu não ficar no prejuízo. Mas, como o capitalismo é selvagem, a escola me proibiu de vender qualquer coisa lá para não atrapalhar a cantina. Na época, eu fiquei tão triste, mas tão triste, que mesmo sabendo que dava para vender "na baixa", eu não quis mais saber de nada.

Nesse meio tempo, em que eu fiquei parada, uma menina da minha turma começou a vender brigadeiros e cupcakes. Sabe, aquilo não era nada agradável de se ver. Eu não iria encrencar porque acho que não vale a pena, mas quem deveria estar ali era eu, não ela. Fiquei bem mal, bem mal mesmo. Vi o meu sonho cair pelo ralo.

Depois, voltei a vender meus brigadeiros e mais tarde até umas tortinhas salgadas. Não tinha o mesmo pique de antes, porém continuei ali, tentando. Eu ainda acreditava, enrolava cada brigadeiro, economizava cada centavo em busca daquilo. Até livros eu deixei de comprar. Sabia que não seria o suficiente, meus pais teriam que ajudar. Ainda assim...

Eis que chegou o fim de ano, e como eu não fiquei em recuperação nem nada, não soube o que fazer. Fiquei em casa, sem ganhar dinheiro mas satisfeita por acabar o ano com aquilo que eu esperava ganhar. Nem mais, nem menos. Minhas metas são realistas, eu acho.

Só que... nos últimos dias, tudo ruiu pra mim. Desculpa se pareço mais uma menina mimada que não se conforma em aceitar perder. Porque foi isso o que aconteceu. Domingo passado painho definitivamente disse: não tenho grana, você tem que passar no vestibular e você não vai, pelo menos não agora. Até aí tudo bem, eu já havia ouvido isso antes e decidi aceitar numa boa.

Sofrer pra quê? Quarta-feira seria o meu aniversário, decidi que esse ano eu não mais passaria o dia chorando no dia 17. Fico sentimental no meu aniversário, tudo vem à tona. Esse ano, apesar de ter tido motivos suficientes para derramar lágrimas, consegui passar o dia com um sorriso no rosto. Estava sozinha, ninguém tinha muito tempo pra mim, não tive a atenção que gostaria. Até ganhei um bolo, mas não tive o prazer de cortá-lo depois de um parabéns. Comi no outro dia, sozinha.

Pelo menos ganhei uns contos de réis. Do padrinho e do tio, oba. "Convertendo para o dólar fica quanto?", pensei. Acho que em algum lugar dentro de mim eu ainda acreditava. Ontem, quando fui juntar a grana que ganhei com a que eu já tinha... péssimas surpresas. Cadê a minha grana que estava aqui?

Tinha algo errado. Fiz as contas e nada batia. Estava tudo errado. A começar pelo fato de eu não ter nascido em berço de ouro e ter que passar por isso, sabe? O que eu estou falando, me desculpem de novo. Talvez eu seja mesmo uma menina mimada que não saiba perder.

Eu me senti impotente, frustrada, com raiva. Por isso, cheguei aqui em frente a essa tela e chorei. Chorei aquilo que eu não chorei quando papai falou que eu não iria, chorei por aquilo que não chorei quando ninguém quis passar o meu aniversário comigo, chorei por aquilo que aconteceu hoje porque eu já não aguentava mais não chorar. Chorei por tudo de ruim que vinha à minha mente.

Desculpem, estou quebrando uma promessa. Ontem prometi que não choraria mais por isso.

Eu quero superar isso, mas tá difícil. São anos de expectativa. Foram dias e mais dias mexendo uma panela. Talvez eu não saiba o que é pegar no batente de verdade e talvez de alguma forma apanhar da vida desse jeito me sirva para alguma coisa. Mas tá doendo, o que posso fazer?

Meu pai me disse que me entende. Sabe que eu não nasci pra isso. Sabe que eu me sinto presa aqui nessa cidade. É tudo verdade. Talvez a excessiva preocupação com o vestibular seja só uma desculpa para a falta de dinheiro. Pai, eu entendo. Não seja justo exigir que ele faça um mágica e arrume 24 mil para eu passar um ano falando inglês, flertando com jogadores de futebol americano e usando um armário patético. É egoísmo demais. Eu só não queria ter tantos sonhos e não poder realizá-los. Por que eu não sou só mais uma que se contenta com um show de forró com os amigos? Por quê? Me diz, vai.

Eu esperei uma mágica, tentei me mover de alguma forma, tentei de tudo. É isso pessoal. Não tenho mais o que dizer nem explicar. Eu só queria... fugir. Sei lá. De qualquer forma, desculpem.

Enxuguei as lágrimas. O assunto morreu aqui.



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