domingo, 2 de agosto de 2015

Não existe chegada sem partida


Ontem me despedi. Uma pessoa se foi da minha vida. Quer dizer, mais ou menos. Pelo menos se tem data para voltar. Ele só não vai estar mais do outro lado da rua por alguns meses. Coisa boba. Além do mais, nem saiu do nordeste e vai vir nos visitar sempre. É só mais uma pessoa seguindo a vida. Nada mais normal.

Apitos de navio. Pé na estrada. Decolagens e aterrissagens. Não vou dizer que isso não mexeu comigo. Lugares lotados de gente que ao mesmo tempo se enche e se esvazia. Gosto deles. Idas. E porque não, vindas. Afinal, é preciso deixar um lugar para chegar em outro. Escolham suas escolhas e renúncias. Não existe chegada sem partida. 

Eu, que sempre me imaginei naquela situação, assisti tudo de camarote. Quase que literalmente. Eu me solidarizava, fingia entender exatamente como era aquela situação. Eu o invejava. Ao mesmo tempo, menosprezava todas aquelas lágrimas. 

Chorei sim, mas não pelos mesmos motivos. Chorei porque já estava chorosa mesmo por tudo e por nada. Mas choraria da mesma maneira se não estivesse. Chorei para mim quando ninguém viu. Porque sou assim. Chorei porque por muito tempo acreditei que seria por mim que chorariam de saudade - ou sei lá porque - e não por ele. Pensei que essa seria a minha hora de ir embora. Não consegui. Não dá mais para voltar para casa com um blazer cheio de bottons. Jamais vou ter uma família nova por um ano. Acabou a chance, passei do tempo. 

Chorei tanto que me senti ridícula por pensar tanto em mim. De despedida, já sei de cor a teoria. Pensei como gostaria que fosse a minha. Gosto de coisas simples e especiais. A essa altura do campeonato, só dava para uma lembrança. Dos cinco sentidos, quis ser lembrada pelo paladar. Fiz a única coisa que sei fazer, brigadeiros. Um pouco de doçura para tirar o gosto salgado das lágrimas. Quis ser lembrada pela visão também. Soldados sempre carregam fotos, é o que vejo nos filmes. E cartas com ordens expressas para só serem abertas quando a distância fosse grande o suficiente. Posso ser razoavelmente boa com as palavras, não com prazos. Portanto, só pude deixar um boa viagem escrito com caneta borrada num verso de fotografia antiga.

Enfiei o depósito de diabetes e alegria num bolso de mala sem ser notada. O abracei como todos os outros. Ainda não aprendi a abraçar. Nem a dizer com a boca as palavras que eu escreveria. Nem a chorar nos momentos convenientes. Eu só sorria. Espero que ele não pense que eu não me importei. Alguns telefonemas. Acenos da área de embarque. Juras de amor eterno para a namorada. Moedas da sorte. Acho engraçado. Pareceu até que alguém iria à guerra. A cena era a mesma, só trocar as roupas e pôr em preto e branco. Adoraria ter levado minha câmera.

Parece que alguém ganhou asas sem nem ter pego um avião. As bagagens foram postas no bagageiro do ônibus e, olhando para nós, ele bateu continência. Seus pais assistiam a cena abraçados. Minha mãe soluçava como não faria pela própria filha. Dava para vê-lo do assento, acenando. Assistimos a partida e fomos embora. Tínhamos que continuar jogando. A propósito, não sei como nenhuma outra língua consegue sobreviver sem a palavra saudade.

Porém, não fico triste por ele. Ele partiu porque precisava chegar. Eu quero também. Só preciso me lembrar que ninguém vai sem sair do lugar.




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